Em decisão unânime, tribunal condena Lula em segunda instância e aumenta pena de 9 para 12 anos
Por unanimidade, os três desembargadores da 8ª Turma do Tribunal
Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) votaram nesta quarta-feira (24) em
favor de manter a condenação e ampliar a pena de prisão do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por corrupção passiva e lavagem
de dinheiro no caso do triplex em Guarujá (SP).
Votaram no julgamento, que durou 8 horas e 15 minutos (além de uma hora
de intervalo) o relator do processo, João Pedro Gebran Neto, o revisor,
Leandro Paulsen e o desembargador Victor dos Santos Laus.
Em julgamento na sede do tribunal, em Porto Alegre, os desembargadores
se manifestaram em relação ao recurso apresentado pela defesa de Lula
contra a condenação a 9 anos e 6 meses de prisão determinada pelo juiz
federal Sérgio Moro, relator da Operação Lava Jato na primeira
instância, em Curitiba. Lula se diz inocente.
Os três desembargadores decidiram ampliar a pena para 12 anos e 1 mês de
prisão, com início em regime fechado. O cumprimento da pena se inicia
após o esgotamento de recursos no âmbito do próprio TRF-4.
Como a decisão foi unânime, o único recurso disponível para a defesa no
TRF-4 são os chamados embargos de declaração, que não têm poder de
reverter a condenação, mas somente esclarecer ambiguidades, pontos
obscuros, contradições ou omissões no acórdão (documento que oficializa a
decisão).
A defesa, no entanto, ainda poderá tentar inocentar Lula nas instâncias
superiores (Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal).
Mas, após o julgamento dos embargos no TRF-4, poderá ser expedida ordem
de execução de sentença. Nesse caso, ao recorrer ao STJ e depois ao STF,
Lula já poderá estar preso.
Resumo
Os três ministros da 8ª Turma do TRE-4 votaram por manter a condenação e
ampliar a pena de prisão de Lula em relação à sentença do juiz federal
Sérgio Moro.
Decisão unânime reduz a uma única possibilidade o recurso de Lula ao
TRF-4 – os chamados embargos de declaração, que terão de ser julgados
pelos mesmos desembargadores, mas não têm poder para reverter a
condenação. Depois do julgamento desse recurso, a sentença poderá ser
executada.
Desembargadores consideraram em seus votos que: 1) Lula recebeu propina
da empreiteira OAS na forma de um apartamento triplex no Guarujá; 2) a
propina foi oriunda de um esquema de corrupção na Petrobras; 3) o
dinheiro saiu de uma conta da OAS que abastecia o PT em troca de
favorecimento da empresa em contratos na Petrobras; 4) embora não tenha
havido transferência formal para Lula, o imóvel foi reservado para ele, o
que configura tentativa de ocultar o patrimônio (lavagem de dinheiro);
5) embora possa não ter havido "ato de ofício", na forma de
contrapartida à empresa, somente a aceitação da promessa de receber
vantagem indevida mediante o poder de conceder o benefício à empreiteira
já configura corrupção; 6) os fatos investigados na Operação Lava Jato
revelam práticas de compra de apoio político de partidos idênticas às do
escândalo do mensalão; 7) o juiz Sérgio Moro – cuja imparcialidade é
contestada pela defesa – era apto para julgar o caso.
A defesa do ex-presidente nega as acusações: 1) diz que ele não é dono
do apartamento; 2) que não há provas de que dinheiro obtido pela OAS em
contratos com a Petrobras foi usado no apartamento; 3) que, de acordo
com essa tese, Moro, responsável pela Lava Jato, não poderia ter julgado
o caso; 4) que o juiz agiu de forma parcial; 5) que Lula é alvo de
perseguição política.
Mesmo após a proclamação do resultado, 1) Lula não será preso de
imediato; eventual prisão só depois do julgamento do último recurso da
defesa ao tribunal; 2) defesa pode recorrer ao STJ e ao STF para tentar
reverter condenação; 3) PT poderá registrar candidatura de Lula a
presidente; 4) candidatura poderá ser mantida enquanto houver recursos
pendentes contra a condenação; 5) TSE é que decidirá se ele ficará
inelegível.
Lula foi acusado pelo Ministério Público de receber propina da
empreiteira OAS. A suposta vantagem, no valor de R$ 2,2 milhões, teria
saído de uma conta de propina destinada ao PT em troca do favorecimento
da empresa em contratos na Petrobras.
Segundo o MP, a vantagem foi paga na forma de reserva e reforma do
apartamento no litoral paulista, cuja propriedade teria sido ocultada
das autoridades. Um dos depoimentos que baseou a acusação do Ministério
Público e a sentença de Moro é o do ex-presidente da OAS Léo Pinheiro,
também condenado no processo.
Além de Lula, também foram julgados Léo Pinheiro (presidente afastado da
OAS); Paulo Okamotto (presidente do Instituto Lula); Agenor Franklin
Magalhães Medeiros, Paulo Roberto Gordilho, Fabio Hori Yonamine, Roberto
Moreira Ferreira (diretores da OAS).
A condenação pelo TRF-4, tribunal de segunda instância, confirma
sentença proferida em julho do ano passado por Moro na primeira
instância.
Lula não será preso de imediato. Antes mesmo do julgamento, o TRF-4 já
havia anunciado que só haverá prisão depois de se esgotarem todas as
possibilidades de recurso no tribunal.
A decisão dificulta, mas não impede, a candidatura de Lula à Presidência
na eleição deste ano. Mas o registro da candidatura dependerá de uma
manifestação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Após a abertura da sessão pelo desembargador Leandro Paulsen, o
julgamento começou pela leitura de um resumo dos argumentos da acusação e
da defesa pelo desembargador João Pedro Gebran Neto.
Acusação
Em seguida, falando pela acusação, o procurador regional da República
Maurício Gerum, reconstituiu o caso e relatou as provas apresentadas
pelo Ministério Público Federal e que, segundo ele, a defesa não
conseguiu contestar. "Lamentavelmente, Lula se corrompeu", concluiu
Gerum.
O procurador começou sua fala atacando a “tropa de choque” mobilizada
para pressionar o Judiciário pela absolvição de Lula. “A truculência
dessa tropa de choque no processo judicial está muito próxima de
configurar o crime de coação no processo”, afirmou.
Depois, Gerum defendeu a independência dos magistrados para decidir o
caso, rebatendo que seja um “julgamento político”, o que seria
“ignorância histórica” e “desrespeito”. “Se esta Corte absolver o
ex-presidente Lula, a justiça será feita. Se esta corte decidir manter a
condenação do ex-presidente Lula, a justiça também será feita”,
completou o procurador.
Ao falar sobre a acusação, Gerum narrou como o ex-presidente e a
ex-primeira-dama Marisa Letícia optaram pela compra do apartamento ainda
em 2005, quando o prédio era construído pela Cooperativa Habitacional
dos Bancários de São Paulo (Bancoop). Destacou em seguida o repasse do
imóvel à OAS e as reformas feitas a partir de 2014 para Lula.
"Não há dúvida probatória. Inúmeras notas fiscais, depoimentos e
mensagens entre executivos, de que o imóvel estava sendo preparado para o
ex-presidente”, disse. Depois, afirmou que não era possível que Lula
desconhecesse o pagamento de propina na Petrobras.
“Muito difícil de acreditar que esse imenso sistema de drenagem dos
cofres da Petrobras pudesse passar ao largo de qualquer presidente da
República. Quando pensamos no presidente Lula, com sua inteligência,
perspicácia e experiência política, a dificuldade fica muito maior. Mas
nós não precisamos ficar na suposição de que ele sabia. Além de ele
mesmo afirmar em seu interrogatório que a palavra final de indicação de
diretores da Petrobras era da Presidência, sua participação nos assuntos
da maior estatal brasileira era evidente e transparece em áudios e
diversos depoimentos”, declarou.
Gerum dividiu o tempo de 30 minutos com o assistente da acusação René
Ariel Dotti, contratado pela Petrobras. Dotti falou por dez minutos. Ele
disse que a estatal sofreu um "atentado" contra seu patrimônio.
"Esse processo revela duas ilhas de um grande arquipélago de ilicitudes.
A corrupção e a lavagem, neste caso notório, estão atreladas à cadeia
de provas que é irresistível à mais simples das lógicas. A Petrobras
acompanha as razões do recurso apresentado pelo MP e lamenta que, por
mais de uma vez, a maior indústria petrolífera do Brasil, uma das
maiores do mundo, sofre atentado gravíssimo contra o patrimônio",
afirmou.
Ele disse esperar que o "produto obtido pelo crime" reverta em favor da
Petrobras, "uma espécie de justiça restaurativa". Também reivindicou a
fixação de um valor mínimo para reparação dos danos.
Defesa
Dois advogados de defesa se manifestaram após a acusação – Fernando
Fernandes, representante de Paulo Okamotto, presidente do Instituto
Lula, e Cristiano Zanin, em defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva.
O primeiro a falar foi Fernandes. Paulo Okamotto foi absolvido pelo juiz
Sérgio Moro, mas a defesa recorreu para pedir a troca dos fundamentos
da sentença. Moro absolveu Okamotto por falta de provas, mas a defesa
quer a declaração de inocência.
Paulo Okamotto foi o responsável por obter os recursos para transportar
para o instituto o acervo de presentes e doações que Lula recebeu
enquanto exerceu o mandato de presidente da República. A acusação do
Ministério Público é que a OAS tenha feito o pagamento.
"Não há nenhum valor da OAS em relação ao acervo que tenha sido entregue
para pagar a Granero [transportadora] e não tenha sido contabilizado ao
instituto, ao Paulo Okamotto ou ao ex-presidente Lula. o valor foi pago
diretamente à Granero. Essa atuação desmedida do Ministério Público é o
indício das falhas neste processo. Detalhar as provas é fundamental",
afirmou Fernandes, que se referiu a um testemunho do antecessor de Lula,
Fernando Henrique Cardoso, para apontar "todas as dificuldades que um
ex-presidente da República tem para manter e custear um acervo
presidencial".
Voto do relator, desembargador Gebran Neto
Relator do processo, o desembargador João Pedro Gebran Neto votou pelo
aumento da pena imposta a Lula, anteriormente fixada por Moro em 9 anos e
6 meses de prisão, para 12 anos e 1 mês, com início em regime fechado.
Em um voto de três horas e meia, ele não leu todas as 430 páginas do
relatório. No texto, ele apontou “culpabilidade extremamente elevada”
pelo fato de o petista ter ocupado a Presidência da República e de ,
segundo afirmou, ter ocupado posição de comando no esquema. Os desvios,
justificou, não apenas prejudicaram a Petrobras, mas também deturparam o
processo político.
“A eleição de um mandatário, em particular de um presidente da
República, traz consigo a esperança à população de um melhor projeto de
vida. Críticas merecem, portanto, todos aqueles que praticam atos
destinados a trair ideais republicanos, sem descuidar, por óbvio, que a
corrupção aqui tratada está inserida em um contexto muito mais amplo e,
assim, de efeitos perversos e difusos”, afirmou.
Gebran Neto começou o voto negando pedidos da defesa para anular a
sentença por falta de competência de Moro. Ele apontou outras decisões
do TRF-4 que mantiveram o caso com o juiz em razão de conexão com a Lava
Jato.
O magistrado também descartou suposta parcialidade do juiz e justificou a
condução coercitiva de Lula determinada por Moro e as quebras de sigilo
telefônico com advogados.
“Houve a participação de advogados e representantes para garantia de
defesa no ato, além de cautelas do magistrado para que o ato fosse o
menos espetaculoso possível”, afirmou.
Após rejeitar todos os pedidos para anular o processo, o desembargador
contestou a tese de Lula de que não haveria uma contrapartida dele, como
presidente da República, à OAS.
Gebran Neto lembrou que não é preciso a formalização um ato de ofício,
mas só a aceitação da promessa de receber vantagem e o poder para
favorecer a empreiteira na Petrobras.
“Não se exige a demonstração da participação ativa de Luiz Inácio Lula
da Silva em cada um dos contratos porque em verdade era o garantidor do
esquema maior que tinha por finalidade incrementar de modo subreptício o
financiamento de partidos, pelo que agia nos bastidores para nomeação e
manutenção de agentes públicos em cargos-chave para a organização
criminosa”, disse.
O desembargador também apontou o “estreito vínculo” entre Lula e o
presidente da OAS, Léo Pinheiro, após enumerar obras em que a
empreiteira foi favorecida na Petrobras.
"Há prova acima de razoável de que o ex-presidente foi um dos
articuladores, se não o principal, do amplo esquema de corrupção. As
provas aqui colhidas levam à conclusão de que no mínimo tinha ciência e
dava suporte aquilo que ocorria no seio da Petrobras.”
Em relação ao triplex, Gebran Neto reconheceu que não houve
transferência formal do imóvel para Lula, mas citou depoimentos de que
ele sempre esteve reservado para o ex-presidente, sobretudo em razão de
reformas personalizadas para ele e Marisa Letícia.
“É como se o apartamento tivesse sido colocado em nome de um laranja.
Nesse caso, a ausência de transferência, transforma em determinado
momento — na medida que podia ter sido transferido e não o foi, a pedido
— a OAS como mera laranja do verdadeiro titular dessa unidade",
afirmou.
Por isso, o fato de o imóvel permanecer como propriedade da OAS, mas
para uso de Lula, comprovaria a tentativa de ocultar a vantagem
indevida, configurando o crime de lavagem de dinheiro.
Nas conclusões do voto, Gebran Neto chamou Lula de “avalista” e “comandante” do esquema de corrupção na Petrobras.
“Havia inequívoca ciência do réu com relação aos malfeitos havidos na
estatal. Ademais disso, dele dependia a continuidade e eficácia do
esquema milionário e financiamento das campanhas eleitorais, de maneira
que sua capacidade de decisão e conhecimento dos efeitos e abrangência
do esquema espúrio mostrou-se fundamental”, disse.
Voto do desembargador Leandro Paulsen
Revisor do processo, o desembargador Leandro Paulsen foi o segundo a
votar, durante uma hora e meia, também pela condenação de Lula. Paulsen
repetiu as penas estipuladas por Gebran Neto: "Adiro ao voto do relator
também no que diz respeito à dosimetria da pena", disse.
No início, afirmou que o processo não tratava “de pequenos desvios de
conduta”, mas “ilícitos penais gravíssimos contra a administração
pública e contra a paz pública, com prejuízos bilionários aos cofres
públicos”.
“Estamos tratando da revelação de criminalidade organizada envolvendo a própria estrutura do Estado brasileiro".
Assim como Gebran Neto, Paulsen também destacou, como “elemento
relevantíssimo”, o fato de os crimes terem sido cometidos por um
presidente da República.
"Luiz Inácio acabou por ser beneficiário pessoal e direto da propina que
estava à disposição do PT, por quanto parte dela foi utilizada no
triplex", afirmou.
Segundo o desembargador, "a eleição e assunção ao cargo não põem o
eleito acima do bem e do mal, não lhe permitem buscar fins nem agir por
meios que não sejam os legais".
"Relativamente à autoria e à culpabilidade de Luiz Inácio Lula da Silva,
o vínculo de causalidade de sua conduta e os crimes praticados é
inequívoco. Luiz Inácio agiu pessoalmente para tanto, bancando
quedas-de-braço com o conselho da Petrobras na condição de presidente da
República."
Paulsen também rejeitou questionamentos da defesa contra a atuação de
Moro no processo, lembrando de decisões do próprio TRF-4 que confirmaram
seus atos durante a investigação.
O desembargador também manteve a absolvição de Paulo Okamotto, por não
ver irregularidade no armazenamento, pela OAS, de parte dos presentes
que Lula ganhou no Planalto.
O revisor ainda citou entendimento do STF no julgamento do mensalão, no
qual dirigentes do PT foram condenados pela compra de apoio político no
Congresso em favor do governo Lula.
Voto do desembargador Victor Laus
Terceiro e último a votar, o desembargador Victor dos Santos Laus também
acompanhou na íntegra o voto dos outros desembargadores.
Em 1 hora e 10 minutos, ele iniciou elogiando a Operação Lava Jato pela
qualidade dos investigadores, advogados e juízes que atuam no caso. Ele
também reforçou afirmação de seus pares que o julgamento se dava sobre
fatos, não pessoas.
“A nós interessa o fato, aquilo que de concreto aconteceu. Pessoas se
viram envolvidas. Mas repito: não julgamos pessoas. O fato de ser
cometido por alguém é do mundo das coisas”, afirmou. Ele reconheceu,
contudo, a complexidade do caso por envolver um presidente.
"Evidentemente que, de sua excelência, era esperada uma atitude
absolutamente diferente. Ou seja, ciente dos fatos que aconteciam em seu
entorno, deveria ter tomado providência, nós sabemos, e assim não o fez
e ficou em silêncio. Para além disso, como demonstrou a situação da
unidade habitacional, auferiu proveito dessa situação. Ou seja, são
fatos lamentáveis, fatos que deslustram a biografia de sua excelência,
mas que são fatos concretos, que ocorreram."
No meio do voto, Laus também rejeitou as contestações que a defesa de
Lula apresentou ao longo do processo – como o impedimento de Sergio Moro
– reforçando que todas já haviam sido analisadas pelo TRF-4 antes do
caso chegar ao tribunal.
Sobre o tríplex, o desembargador disse ter considerado todos os
depoimentos tomados no processo, inclusive de quem colaborou com o caso,
como os executivos da OAS Léo Pinheiro e Agenor Franklin Martins. A
defesa alega que eles mentiram para obter benefícios.
“O tão só fato de cidadão acusado querer colaborar não desqualifica sua
fala, porque há de merecer consideração desde que em harmonia com outros
elementos do processo”, disse, lembrando que os executivos ainda não
tiveram acordos de delação premiada homologados.
Fonte: G1
Em decisão unânime, tribunal condena Lula em segunda instância e aumenta pena de 9 para 12 anos
Reviewed by Aelson fotos
on
19:38
Rating:
Nenhum comentário